Todos vivemos momentos assim. Não é simplesmente uma indifinição sobre uma coisa ou outra, mas uma indefinição entre o que somos e fazemos e algo que não sabemos bem o que é. Parece que é um desejo de estar em outro lugar, em outro tempo, fazendo algo diferente ao invés de estar onde estamos, neste tempo e envolvidos com o que fazemos agora. Mas a grande questão é que a maioria de nós não sabe, minimamente, pra onde queremos ir e o que gostaríamos de fazer.
Estamos novamente no terreno da dúvida. Na última vez, prometi dividir com vocês um pouco de minhas reflexões quanto à duvida. Procurei ajuda em um livro muito interessante, buscando ordenar um pouco as idéias. SARGENTIM escreveu um dicionário bem diferente, chamado DICIONÁRIO DE IDÉIAS AFINS, onde relaciona inúmeros termos (substantivos, verbos e adjetivos) que de alguma forma se ligam à palavra pesquisada.
Vamos ver parte do que acompanha o ato de duvidar, com base nestes termos correlatos. Quem dúvida está DESCONFIADO. Falta segurança nas bases em que se apóia. Temos dúvida em relação ao um amigo quando sentimos que não podemos confiar por inteiro. Duvidamos que estamos certos quando nossos atos causam EMBARAÇO. Se temos certeza, nossos atos só deviam trazer conseqüências positivas, e nunca nos deixar envergonhados, oras.
Nossa cabeça se enche de pontos de interrogação quando nossa forma de ver o mundo causa CONTROVÉRSIA. Não devia ser assim. Afinal, como posso estar certo se tantos outros manifestam uma idéia diferente?
Dúvida se relaciona com ENGANO, HESITAÇÃO, IMPRECISÃO. Temos de novo muitas perguntas, e quando isso acontece nossas idéias e pensamentos são PROBLEMÁTICOS, QUESTIONÁVEIS, EQUIVOCADOS, CONFUSOS, INSTÁVEIS. Quando, em qualquer situação, nos vemos cheios de questões e desprovidos de respostas começamos a duvidar, ou DE UMA OUTRA FORMA, começamos a DESCONFIAR, SUSPEITAR, COÇAR A CABEÇA, PRESUMIR, INFERIR, PROBLEMATIZAR demais as coisas.
O resultado de tudo isso é imobilidade. A dúvida, em seu aspecto negativo, nos impede de agir. Isto porque quando todos estes verbos e adjetivos circulam por nossa mente, colocamos em xeque a realidade. Não confiamos mais no que temos, no que sabemos, no que aprendemos. Nossos instintos falham e nossa mente tateia no escuro, buscando entre aquilo que conhecemos (experiências, aprendizado, idéias, histórias, lembranças...) algo que posso funcionar como lanterna. A sensação é a de estar em um pequeno círculo iluminado, cercado por densa escuridão. O espaço que ocupamos parece não ser ideal e nem confortável, mas não nos atrevemos a sair dele. E nós não o fazemos por que nos faltam EVIDÊNCIAS de que lá no escuro existe algo bom, melhor ou confiável.
Quando duvidamos questionamos a realidade, a nossa realidade. Mas a dúvida não nos apresenta um quadro alternativo. Em seu aspecto positivo, porém, ela nos faz SUPOR que existe outro lugar, outra atividade, outras pessoas, outras sensações. A dúvida nos coloca em movimento. Ela nos faz desejar ter respostas, buscar por certezas e entender que a realidade é dinâmica.
De forma negativa ficamos engasgados, desnorteados, desorientados, embaraçados e nutrimos suspeitas. Nossas idéias são contestáveis, nossos pensamentos imprecisos, nossos atos inconseqüentes e equivocados. Nossas emoções ficam instáveis e nossas escolhas discutíveis. Vamos de opinião em opinião, de forma vaga. Não progredimos, não construímos, não nos realizamos...
De forma positiva, porém, questionamos o lugar e o tempo. Contestamos o pequeno círculo iluminado, formulamos hipóteses, conjeturamos novas idéias, desejamos sair da obscuridade, causamos perplexidade e mudança. Nossas idéias se tornam alavancas, e nossas emoções se tornam combustível.
Quando leio sobre Jesus, percebo que Ele ensinava usando os lados negativo e positivo da dúvida, formulando perguntas. Sempre que temos perguntas, estamos no reino da dúvida, lembra? Jesus causava reflexão colocando na mente de seus alunos e discípulos dúvidas sobre as bases em que eles se apoiavam. Assim que eles questionavam o seu viver em seus pequenos círculos iluminados, Jesus lhes aplicava o caminho da verdade, que lhes dava certeza.
A partir da descoberta da verdade, eles não deveriam mais duvidar. Jesus agia firmemente quando eles deixavam que a dúvida voltasse a operar em assuntos já definidos. Por exemplo, assim que eles descobriram e entenderam que Jesus era o filho de Deus e que detinha um imenso poder, não deviam mais questionar isso. Por isso, quando Pedro afundava nas ondas, indo ao encontro de Jesus, Este o confrontou duramente dizendo "Porque duvidastes?".
Dúvidas que geram certezas. Eu posso estar equivocado, mas pra mim, faz sentido. E pra você? Talvez estejamos encontrando um caminho para ampliar nosso pequeno circulo iluminado, ou buscando, DE UMA OUTRA FORMA, coragem para vasculhar a escuridão. Pense nisto.
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