Ao que parece, sou um inveterado
viajante do tempo, como já comentei em outra postagem. Não consigo deixar de
viajar ao passado. Minhas memórias de infância, aparentemente forradas de
pequenos acontecimentos irrelevantes e de centenas de histórias aparentemente
singelas, de vez em sempre irrompem para me mostrar que podem me ser valiosas
para viver o presente e fazer melhor aquilo que me é proposto.
Olhando alguns garotos que se
entretinham com uma partida de futebol, vi da minha janela, o grupo que estava
fora da quadra. Eles torciam avidamente pelos gols, e não importava que time
conseguisse a vitória, desde que fosse logo. Eles não estavam torcendo pela vitória
de um ou de outro, mas por sua vez de entrar em quadra.
Os garotos “de fora” estavam
ávidos para brincar, loucos pra ter sua vez, e por isso faziam papel de
técnicos, de torcedores e de gandulas. Como a regra era que cada partida
terminasse com dois gols, cada oportunidade perdida era seguida de um “uuuuuuhhh”
que vinha lá do fundo de um coração ansioso por ter sua vez, sua chance de
jogar. Quando a partida terminou os “de fora” entraram na quadra pulando, dando
cambalhotas e empurrando os perdedores pra fora, com sorrisos de uma alegria
tão grande, tão vibrante, tão contagiante que parecia sobrepujar todas as
coisas boas do mundo.
Foi aí que minha máquina do tempo
se ativou, e viajei ao tempo em que eu mesmo era um garoto “de fora”. Campo de
terra, traves feitas de galhos amarrados, pés descalços e uma ansiedade
tremenda para entrar logo no jogo. O que definia minha participação era a
certeza total, a vontade determinada, um desejo irrefreável de jogar. Eu
queria, e queria muito. Então ficava lá, torcendo pelos gols, alertando os
jogadores e orientando as jogadas, buscando a bola que insistia em rolar pelos
barrancos ou cair entre as moitas que cercavam o campo, sendo um gandula ligeiro,
para que a minha vez chegasse logo.
Quando o time era formado, os
dois privilegiados que tiravam um “par ou impar” para escolher seus jogadores,
eram cercados pelos colegas, com mãos erguidas e gritos de “me escolhe” e eu
sempre dizia “eu quero, eu quero!”. Minhas memórias de infância novamente
despertaram questionamentos inquietantes: onde foi parar minha vontade de
participar? Onde foi parar meu grito de “eu quero”?
Pense comigo DE UMA OUTRA FORMA.
Parece que enquanto adultos deixamos de torcer para que nossa vez chegue logo.
Os que conseguem causar impacto neste mundo parecem ter um dom especial, mas na
verdade apenas preservaram a vontade constante de entrar no jogo, enquanto a
maioria de nós demonstra ter perdido o desejo de jogar. Não nos animamos a
fazer o papel de gandulas, não ficamos na linha do campo observando os
jogadores, medindo sua capacidade, aprendendo novos dribles, orientando
possíveis jogadas, e muito menos temos levantado as mãos para ser escolhidos
pra uma partida. Os garotos “de fora” estavam o tempo todo querendo estar
dentro. Os adultos “de fora” parecem não se importar. Mesmo que haja desejo,
ele não está sendo expresso, não está sendo ansiosamente esperado, estamos deixando
de criar oportunidades. E isto é lamentável.
O tornar-se adulto rouba de nós
aquela certeza plena de querer estar no jogo. Começamos a achar que para estar
lá precisamos ser bons, que precisamos estar super preparados, que precisamos
sempre vencer. Quando eu era menino não me preocupava se existiam outros jogadores
melhores do que eu, quando eu dizia “eu quero” e entrava pra jogar, sabia que
podia sair de novo, mas o bom mesmo era jogar. Se ganhasse, ótimo, se não sabia
que dali a “cinco minutos ou dois gols” estaria de volta.
Então, minha memória dos tempos
de menino diz – Ei! Volte a dizer “eu quero”. Observe o jogo, pegue as bolas
que fogem pra ajudar de alguma forma, fique atento, dê palpites, torça, se
motive, você por estar dentro a qualquer momento. Quando entrar, se entregue,
corra e aproveite. Se sair, mantenha a atitude de quem quer entrar de novo.
Isso vale para o estudo, para os relacionamentos, para o trabalho e para a
vida.
Dwight Lyman Moody, um dos
maiores evangelistas do século 19 ouviu um pregador dizer que um homem
totalmente consagrado a Deus, cheio do desejo de causar impacto, precisava
apenas se colocar no jogo e o mundo veria o resultado. Moody refletiu sobre o
sermão e disse mais tarde:
“Ele disse ‘um homem’. Ele não
disse grande homem, nem sábio, nem rico, nem eloquente, nem inteligente, mas ,
simplesmente ‘um homem’. Eu sou um homem, e cabe ao homem decidir se deseja ou
não se consagrar, inteira e completamente. Estou resolvido a fazer todo o
possível para ser esse homem.” – A vida de D.L. Moody por William R. Moody.
Bom, Moody disse “eu quero”. Ele
não disse isso para entrar num jogo de futebol entre crianças que se divertem,
mas para a oportunidade de causar impacto positivo e significativo no mundo.
Nós podemos fazer o mesmo. Não precisamos ser os melhores, só precisamos fazer
o mesmo que os “garotos de fora” fazem no jogo: estar lá quando a oportunidade
aparecer.
Diga “eu quero” no trabalho, no
serviço voluntário, quando puder contribuir com alguém, quando estiver com quem
ama e puder demonstrar. Diga “eu quero” para as fantásticas coisas que pode construir,
e mantenha acesa a chama da infância que não nos deixava admitir a ideia de
ficar de fora das boas coisas. Pense nisto.