Sentir-se pequeno. Me lembro de uma revista em quadrinhos, do Tio Patinhas, que trazia uma história sobre um rico fazendeiro, que recebendo a visita do pato quaquilhonário e de seu sobrinho, Donald, mostrava orgulhoso seu patrimônio.
Fazenda que levava anos para ser percorrida, inumeráveis cabeças de gado, instrumentos de ouro e uma sala imponente, que tinha de um lado uma porta enorme, com a parte superior bem larga e alta, e de outro uma portinha baixa, estreita e de material inferior. Segundo o rico fazendeiro, pela porta grande entravam os visitantes milhonários, cheios de si e seguros de sua fortuna, mas depois de olhar suas riquezas, saiam curvados, pequenos, pela portinha do reconhecimento de sua pobreza...
Donald, durante toda a visita, ia se lastimando pelo tio, imaginando o quanto ele se sentia pobre diante de tanta grandeza. E pensava em como o velho pato sairia, pequeno, pela porta baixa e estreita.
Neste momento, o Tio Patinhas se apresenta: sou o velho pato que lhe emprestou o dinheiro para que você construisse seu império. O Fazendeiro se assusta e gagueja. E Donald, com olhos baixos, diz ao tio: o senhor vai sair pela porta grande, enquanto eu vou passar pela portinha, pelo buraco da fechadura...
Coisas da minha infância. Já saí pela porta pequena muitas vezes. E, curiosamente, quase sempre o que precede esta saída humilhante é uma entrada arrogante pela porta larga e alta. Não é nada fácil manter a grandeza com base em realizações e posses. Sempre há alguém maior, mais rápido, com mais posses. Sempre acontecem revezes e incidentes que roubam a grandeza e também a fortuna... Por outr lado, manter a grandeza da dignidade, da honradez pelas boas escolhas também é muito difícil. A porta estreita parece ser o caminho mais comum pra muitos de nós.
Hoje, primeiro dia do ano, assisti aos jornais que mostravam como foi a festa da virada em várias cidades do Brasil e do mundo. Um show de grandeza. Luzes, música, palcos enormes, milhares de pessoas, muito dinheiro investido, muitos sonhos e muita positividade. Um sem número de crenças desencontradas, de mitos e ritos vazios, justapostos a motivações sólidas e de compromissos pessoais sérios e automotivados... Tudo envolto na grandeza do espetáculo.
A posse da presidente Dilma também foi hoje. Autoridades, líderes, aplausos, discursos. Grandeza de poder, transmissão de poder, sonhos de poder e de grandeza. Lula e o poder não transmitido de uma polularidade de 87%, o puro poder do carisma... Gente esperançosa, gente simples e gente culta, gente de todas as classes, gente que aspira por grandeza e gente que concede grandeza. Gente grande e gente que sem saber, é maior ainda... Tudo envolto na grandeza do momento.
Diante de tudo isso me senti pequeno. Mas vendo DE UMA OUTRA FORMA, não é um sentimento ruim. É o sentimento da dependência sadia que reconhece a debilidade humana, e que orienta a busca de apoio, de ajuda, de aceitação. E o reconhecimento da minha necessidade de um poder maior, de alguém infinitamente maior para que eu seja verdadeiramente grande.
Sentir-se pequeno nem sempre é sentir-se inadequado. Nem sempre é questão de baixa auto-estima. Saber-se pequeno é o primeiro passo para querer mudar. Que este ano seja, então, o ano do crescimento, o ano do reconhecimento, o ano da aspiração legítima pela verdadeira grandeza. Em geral, aquilo que é verdadeiramente grande, começa de uma pequena semente. Pense nisto.